«Infraestruturas que, ainda hoje, são um obstáculo à inclusão da pessoa com deficiência no mundo laboral. Hoje, 1 de fevereiro, entra em vigor novas quotas para as pessoa com deficiência nas empresas.
Umas escadas quase que deitaram por terra o destino profissional de Carla Neves Matias: a advocacia. “Aquela rampa que hoje está na Faculdade de Direito fui eu que chateei toda a gente até à exaustão, porque não existia, nem cá fora, nem lá dentro”, conta. “Sei de algumas pessoas que não se inscreveram no curso precisamente porque não tinham como ultrapassar os obstáculos.” Sem uma rampa, a sua autonomia – utiliza uma cadeira de rodas para se deslocar – estava seriamente comprometida. “De manhã, e à tarde, quando saía, era um momento horrível. Tinha de escolher alguém a quem pedir para me ajudar a subir os degraus. E, muitas vezes, a minha vontade era ir embora, porque não tinha de me sujeitar àquilo”, relembra a hoje sócia da SRS Legal. A partir de hoje, 1 de fevereiro, entra em vigor a nova lei das quotas para a contratação de pessoas com deficiência.
Mais de duas décadas depois, no mundo do trabalho, Carla Neves Matias continua a deparar-se com obstáculos físicos que impossibilitam o acesso da cadeira de rodas que utiliza. “Lembro-me de uma vez em Lagos, em que o piso térreo estava desocupado, mas o tribunal era no primeiro andar, sem elevador. Tive de ser carregada por dois funcionários judiciais, com a ajuda do advogado da contraparte. Isto pode criar em mim um sentimento de inferioridade perante o meu colega, que não é bom para o exercício da profissão”, considera.
Reclamou e a resposta que obteve, de alguém do Ministério da Justiça, foi: “A senhora advogada não está impedida de exercer a sua atividade, tal como se viu porque pôde preencher o livro de reclamações”. “O mundo não está muito pensado… mas os tribunais deveriam dar, se calhar, o primeiro passo”, destaca. “Os arquitetos deveriam ir ao centro de medicina de Alcoitão. E o legislador também. Para tentarem perceber o que é a realidade de pessoas com deficiência.”
Entre as empresas, Carla Neves Matias encontra, várias vezes, o mesmo problema. “Alguns afirmam ter todas as condições para receber [pessoas com deficiência], e não é verdade. Vou a reuniões e há momentos constrangedores, em edifícios até bastantes recentes, em que certas coisas não foram pensadas: têm elevadores, um sítio mais largo para passar, mas, por exemplo, o acesso para o elevador dos escritórios tem três degraus”, refere. Para evitar constrangimentos, atua preventivamente. “Tenho sempre o cuidado de dizer ‘Não me importo de deslocar-me, se garantir que tem acesso para uma cadeira de rodas. De outra forma, convido-o a vir ao meu escritório’.”»